quarta-feira, 14 de outubro de 2009

FRAÇÃO
A experiência tem nos mostrado que o conceito de fração não é bem compreendido pela maioria dos indivíduos, fato este, que temos observado no decorrer de vários anos em trabalhos com acadêmicos de diversos cursos da Universidade, bem como, através de cursos de capacitação para professores.


Em virtude de tais dificuldades, escrevemos este texto visando a construção de tal conceito. Para isto, discutiremos a necessidade de uma primeira ampliação do conceito de número, apresentando também, uma proposta metodológica, a fim de atingir tal objetivo.






O conceito de divisão de um todo






Os significados da palavra dividir segundo Aurélio Buarque de Holanda Ferreira são:


1. Partir ou distinguir em diversas partes; separar as diversas partes de; desunir: "Os cientistas dividiram o átomo".


2. Estabelecer desavença entre; por em discórdia; desavir; indispor: "A notícia dividiu os legisladores".


3. Limitar; demarcar; extremar: "A Cordilheira dos Andes divide vários países".


4. Cortar; sulcar: "O barco dividia as águas tranqüilas da lagoa".


5. Separar; apartar: "Um tabique de madeira divide os dois cômodos". "O Arroio Chuí divide o Brasil do Uruguai".


6. Distribuir; repartir: "A Cooperativa dividiu os lucros pelos associados".


7. Classificar: "Lineu dividiu os animais em 6 classes".


8. Dispersar esforços em detrimento de um interesse comum: "A hora é de somar e não de dividir".


Embora tais significados sejam bastante utilizados, a escola ao trabalhar com a divisão não leva em consideração todas essas situações, se restringindo apenas ao conceito matemático de divisão que não coincide com o conceito que a criança apresenta num primeiro momento, fato este que podemos observar quando uma criança é solicitada a dividir o seu lanche com o seu colega.


Para introduzir o conceito matemático de divisão, é necessário analisar todas as possibilidades da divisão de um todo, levando-se em consideração: sua natureza, as características de suas partes e as características do resto.


















a) A natureza do todo






Um "todo" pode ser de duas naturezas, a saber: discreto e contínuo. Um "todo" é dito discreto quando formado por unidades indivisíveis. Entre vários exemplos citaremos alguns: uma coleção de bolinhas de gude, de livros, de notas de dinheiro, de tampinhas, de pessoas. Observe que cada unidade dos conjuntos citados, perde sua característica original quando submetida a uma divisão. Um "todo" é dito contínuo quando formado por unidades que, teoricamente, admitem divisibilidade infinita, como por exemplo, uma folha de papel, barbante, um canudo, um sólido, entre outros.


Dependendo do contexto, certos "todos" poderão ser considerados como discreto ou contínuo. No caso de uma coleção de canudos, se estiver estabelecido que a divisão deva ocorrer de forma que sejam distribuídos canudos inteiros, então esta coleção representa um todo discreto, no entanto, se a divisão ocorrer de forma que seja possível distribuir pedaços de canudo, tem-se então, um todo contínuo.


É importante salientar que a natureza do todo interfere no ato de dividir, pois no caso discreto, as possibilidades de divisão são limitadas, enquanto que, no contínuo tais possibilidades são infinitas. Considerando 8 tampinhas, verificaremos que é possível dividi-las, no máximo, em 8 partes, enquanto que uma folha de papel pode ser dividida em um número qualquer de partes.






b) As características de suas partes






Antes de dividir um todo qualquer, se faz necessário estabelecer condições sobre suas partes: se elas serão iguais ou desiguais. No caso das partes serem iguais, observa-se que se o todo for discreto, tais partes deverão ter a mesma quantidade de elementos e se o todo for contínuo, as partes deverão ter a mesma medida.






c) As características do resto






Em seguida, deve-se impor condições sobre o resto, ou seja, que este deva ser o menor possível. Desta forma, pode se obter o resto zero ou um número diferente de zero. Tal fato nos leva ao conceito de divisão exata, no primeiro caso e inexata no segundo caso.


Neste momento, temos condições de conceituar matematicamente divisão, ou seja, que o todo seja sempre dividido em partes iguais e que o resto seja menor possível.










A ampliação do conceito de Números






De posse de tal idéia conceituaremos fração que nada mais é do que uma divisão na qual o todo deve ser dividido em partes iguais de forma exata. Observamos que quando o todo é discreto a possibilidade de obter frações é finita enquanto que no todo contínuo as possibilidades são infinitas.


É importante destacar que a fração é obtida através da aplicação de duas operações sucessivas sobre um mesmo todo, a saber:a) a ação física de dividir o todo em um certo número n de partes iguais;b) o ato físico de reunir em um novo todo, um número qualquer m de partes iguais às obtidas com a divisão realizada no todo inicial.


De acordo com os valores de m e n, as frações são classificadas em:frações próprias quando m for menor que n e neste caso o novo todo será sempre menor que o todo inicial e em frações impróprias quando m for maior que n e neste caso o novo todo será sempre maior que o todo inicial. Em particular, quando m for múltiplo de n, a fração é denominada fração aparente.


O número m representa a quantidade de partes iguais que compõem o novo todo por isso denominado numerador da fração. O número n indica a quantidade de partes iguais que o todo inicial foi dividido daí justifica-se ser designado denominador. A simbologia utilizada para representar um número fracionário é






Aspectos cognitivos a serem considerados para a aquisição do conceito de Fração.






Sabe-se pela história que por volta do ano 3000 a.C., um faraó chamado Sesóstris repartiu as terras do Egito, às margens do rio Nilo, entre poucos agricultores privilegiados, tendo em vista a maior produtividade dessas terras após as enchentes, ficando os mesmos, obrigados a pagar por ano, um certo tributo ao faraó.


O início das cheias se dava no mês de junho e quando as águas avançavam sobre as margens, as demarcações de pedra eram derrubadas e havia necessidade de novas medições após as enchentes, a fim de marcar novamente os limites do terreno de cada agricultor.


Para a medição eram usadas cordas e a unidade de medida era marcada através de nós nas mesmas. A corda era esticada e se verificava quantas vezes aquela unidade de medida estava contida nos lados do terreno. No entanto, dificilmente a unidade escolhida cabia um número inteiro de vezes nos lados do terreno e assim os egípcios se viram na necessidade de se criar um novo tipo de número: o número fracionário.


Observemos com isto que o aparecimento de frações está relacionado com o problema de medição de áreas e daí o ensino de frações estar vinculado com a área de figuras geométricas e por conseguinte a uma divisão de um todo contínuo.


No entanto, para a criança compreender o conceito de fração através de um todo contínuo, ela precisa ter adquirido a conservação de área, comprimento etc. ou seja, a conservação de quantidades contínuas.


No livro, Aprender Pensando, José Maurício de Figueiredo Lima, nos apresenta uma sondagem feita com crianças, no que diz respeito à conservação de área, no caso em que as partes de um todo sejam tomadas iguais. O autor apresentou às crianças quatro situações às quais mostramos abaixo:










Maria Pedro Maria Pedro


























Situação 1 Situação 2


























Situação 3 Situação 4






As respostas das crianças não serão transcritas aqui, mas podemos dizer que houve crianças que acreditavam que havia mais onde estava cortado isto porque se fixavam apenas na quantidade de partes, enquanto outras achavam que havia menos porque estava cortado e neste caso se fixavam no tamanho das partes.


Este tipo de conservação de quantidade é fundamental para a compreensão do conceito de fração, pois a criança precisa perceber alguns fatos que ocorrem quando se divide um todo em partes iguais:






1º) A existência de um todo divisível.


Há crianças que se negam a dividir um todo em partes.






Fátima – 5 anos – Escola Pública


Experimentador: Divida este bolo para Maria e Pedro de modo que eles comam o mesmo tanto de bolo.


A criança se recusa a cortar e diz: “Faço outro bolo e dou a ele”.






2°) Existência de um número determinado de partes.


Há crianças que dividem o todo sem pensar no número de pessoas para as quais vai distribuir as partes, com isso, o número de partes pode ficar maior ou menor que o número de pessoas.






3°) Esgotamento do todo.


O próprio conceito de fração nos diz que um todo ao ser dividido em partes iguais não pode, de maneira alguma, sobrar resto. É comum, crianças pequenas deixarem resto quando dividem um todo em partes iguais.






4°) Relação entre o número de partes e o número de cortes.


Muitas crianças ao dividirem um todo num certo número de partes iguais, confundem o número de partes com o número de cortes. Se solicitadas a cortar um todo retangular em três partes iguais, muitas o fazem utilizando três cortes e assim obtendo quartos.






5°) Igualização das partes.


Ao fazer a divisão do todo a criança precisa colocar em relação as partes com o todo, mas também as partes entre si, pois só haverá fração quando as partes forem exatamente iguais.






6°) Cada parte pode se tornar um novo todo possível de novas divisões.






7°) A soma das frações é igual ao todo inicial.


Como já vimos, existem crianças que acreditam que um todo é menor (ou maior) que as partes reunidas.






Como podemos observar, para que a criança compreenda o conceito de fração é preciso que a mesma consiga coordenar vários aspectos que relacionam o todo e suas partes, além da conservação de quantidade contínua, no caso do todo ser contínuo e conservação da quantidade discreta, no caso do todo ser discreto. Ainda mais, a pouco familiaridade que a criança tem com área de figuras geométricas é um complicador para a compreensão do conceito de fração.


Assim, acreditamos que o início do estudo de frações é facilitado se utilizarmos quantidades discretas, ou seja, coleções de objetos, pelo fato da criança estar familiarizada com tais conjuntos e além disso a conservação da quantidade discreta ocorre antes da conservação da quantidade contínua. No trabalho com frações de todos discretos, o que a criança precisa é dominar a contagem, correspondência biunívoca e o único fato novo para ela, será as denominações das frações e o próprio conceito de fração.






Sendo assim, propomos que o estudo de frações seja desenvolvido como segue:






a) Conceito de fração sem utilizar a simbologia matemática formal:


a.1) Com todo discreto:


a) fazendo uso de material manipulativo;


b) através de representações gráficas.


a.2) Com todo contínuo:


a) fazendo uso de material manipulativo;


b) através de representações gráficas.






b) Apresentação da simbologia e o conceito de frações impróprias.






c) Equivalência de frações em todos discretos e contínuos.






d) As quatro operações com frações: adição, subtração, multiplicação e divisão utilizando todos discretos e contínuos.






Em cada item citado acima, tivemos a preocupação de obedecer três graus de abstração: o primeiro grau é caracterizado pela manipulação de materiais que possam auxiliar a criança na solução do problema de forma que ela possa traduzi-lo concretamente, o segundo grau é caracterizado pelas representações gráficas que ajudarão a criança a solucionar os problemas e no terceiro grau, apenas com a leitura do enunciado do problema, a criança já terá condições de resolvê-lo.


Associado ao conceito de fração há três tipos de problemas que são essenciais à compreensão do mesmo, além de serem importantes para a criança traduzir informações recebidas diariamente através dos meios de comunicação ou em quaisquer outras situações do seu cotidiano. Estes três tipos de problema são:






1º) "Dado um todo, determinar uma certa fração desse todo";






2º) "Dada uma fração de um todo, determinar o todo";






3º) "Dados dois todos, determinar que fração um é do outro".






Vamos procurar esclarecer cada um dos tipos de problemas através de exemplos:






1º TIPO: Separando 3/4 de 12 tampinhas; quantas tampinhas serão separadas?






2º TIPO: Oito tampinhas representam 2/5 de quantas tampinhas?






3 TIPO: Cinco tampinhas que fração é de 12 tampinhas?

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